Correio Popular - Caderno C - Pág. 12 - Vândalos picham a histórica escola Carlos Gomes
Os jovens que buscam mais adrenalina durante as noites escalando paredes para grafar garranchos em monumentos e prédios romperam uma espécie de código de ética que existia até agora e picharam um dos mais importantes patrimônios de Campinas: a Escola Carlos Gomes, na Avenida Anchieta. “A escola sempre foi poupada, mas agora rompeu-se um tabu e não sabemos mais o que poderá acontecer”, lamenta a diretora da unidade, Maria Auxiliadora Castelar Brito Alves.
É mais um prédio atingido pelos adolescentes, que não pouparam nem as palmeiras imperiais da Rua Irmã Serafina e do Jardim Carlos Comes, no Centro. Rabiscos enormes tomam conta de nove das históricas árvores. Nada revela mais a sensação de abandono do Centro de Campinas do que as pichações. Basta ver, por exemplo, o prédio do antigo Cine Jequitibá, na esquina da Avenida Anchieta com a Rua General Osório. As pichações indicam o desrespeito e a indiferença com o patrimônio histórico da área central.
Prédios como o Palácio dos Azulejos, a Escola Carlos Gomes, a estátua de Anchieta, o monumento do Bicentenário de Campinas, os barracões da Estação Ferroviária Central, o coreto e os monumentos do Jardim Carlos Gomes se tornaram vítimas desses jovens. Para mostrar que são os melhores, cada grupo quer ousar mais que outro. A diretora da Escola Carlos Gomes está inconformada com a ação dos pichadores. A escola está em reforma e a pintura da fachada não estava incluída nas obras porque ainda estava em boas condições. “Agora, vamos ter que pintar”, comenta. Ela lembra que o colégio sempre foi respeitado. Os alunos não rabiscam as paredes, e o prédio há muitos anos não era vítima dos adolescentes. Ela tem certeza que os alunos não participaram dessa ação.
Para ela, a pichação foi feita por adolescentes de fora da escola. “Pichar é um ato de rebeldia. A cada época, essa rebeldia é manifestada de uma forma. Agora, a moda é pichar e os jovens fazem isso para marcar presença e mostrar que não estão de acordo com a ordem vigente”, analisa.
Cadeia
Existe legislação federal contra essa prática. No caso de a pichação ser feita em imóvel ou monumento tombado, a pena é de três meses a um ano de detenção e multa. As penas alternativas que têm sido utilizadas determinam que os infratores limpem o local pichado.
O promotor José Roberto Albejante, da Promotoria do Meio Ambiente e Patrimônio Histórico, explica que a pichação é crime. O dificil é identificar os autores. “A pichação é demonstração de poder entre os adolescentes. É a forma que encontram de extravasar a insatisfação e a descrença com a vida moderna, com o país. Ele faz isso para ser visto”, analisa.
Com formas que mais parecem rabiscos, as pichações mostram a falta de habilidade artística dos garotos. Qualquer um pode pichar, enquanto só quem sabe desenhar grafita. Essa diferenciação artística diferencia hierarquicamente os grupos, não ficando apenas no melhor traço, mas na ousadia. Quem picha no lugar mais alto ou mais próximo da Polícia é o melhor.
Enquanto as pichações são palavras cifradas, que, juntas, formam um alfabeto gótico-hieroglífico, os grafites são expressões artísticas que abusam do uso de cores e dos desenhos, formando desenhos e formas, por vezes com intenções de crítica e revolta.
Monumentos passarão por restauração
O responsável pela implantação da Zeladoria do Centro, Reinaldo Cicone, garantiu ontem que ainda este ano os monumentos de Campinas passarão por limpeza e restauração especializadas. A maior parte dos monumentos está coberta por pichações. Ele informou que está em fase final de elaboração o memorial descritivo de todo esse patrimônio, com a descrição dos procedimentos que deverão ser adotados na limpeza e restauro para ser encami-nhado à análise do Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico de Cultural de Campinas (Condepacc).
Com a aprovação, será aberta uma licitação para contratar uma empresa especializada nesse tipo de trabalho. Cicone lembra que não basta água e escova para tirar a poeira encrustrada nos granitos e mármores. As pichações, por exemplo, precisam de uma ação mais técnica e especializada para sair, usando, por exemplo, o jateamento com areia.
Depois de limpos, os monumentos serão protegidos por uma resina especial, que não é solúvel em solventes comuns. Se o monumento for pichado novamente, a tinta é facilmente removida com solvente orgânico, como querosene ou tiner. “Mas vamos precisar de autorização para isso, porque às vezes alguma técnica de impermeabilização pode mudar a textura da peça”, ressalta Cicone, que dirige o Departamento de Serviços Públicos da Prefeitura.
A Zeladoria do Centro começará a atuar a partir da segunda quinzena do mês, em 14 quadras entre a Avenida Anchieta, Barão de Jaguara, Barreto Leme e General Osório. Elas integrarão um projeto-piloto para testar métodos de trabalho. Essas quadras passarão por uma faxina completa, com consertos de calçamento, reforço de iluminação e até arborização. A Zeladoria é uma das 14 ações previstas no programa de revitaltzação do Centro. (MTC)