ENTREVISTA
CELSO PIXINGA
“É muito bom ser reconhecido, mas eu sou um eterno aprendiz"
Considerado um dos melhores contrabaixistas do mundo, o músico Celso Pixinga (Celso Claudio Cascarelli) completa 25 anos de carreira em 2007. Com 53 anos de idade, ele é a prova de que nunca é tarde para aprender, já que começou a tocar o instrumento aos 28 anos, incentivado pelos cantores Eduardo Araújo e Silvinha, da jovem guarda. Depois que descobriu o baixo, o músico se entregou ao estudo, chegando a estudar 16 horas diárias durante um ano. Essa dedicação lhe rendeu bons resultados: Pixinga foi o primeiro brasileiro a lançar um disco no Blue Note de Nova York(1997) e a participar de grandes festivais, como o Free Jazz(1988). O músico recebeu influências de grandes nomes do jazz e da música brasileira, mas prefere não rotular sua música.
Atualmente, ele trabalha como educador e com a divulgação da música instrumental. Com parceria firmada com a revista Cover Baixo e a Escola de Música & Tecnologia, Pixinga coordenou a 4ª edição do Festival Cover Baixo, realizado em Campinas/SP de 24 a 27 de janeiro/2007. Ele revelou que há mais dez edições do evento programadas para o Brasil. Paralelamente, ele aguarda o lançamento do seu terceiro de DVD, previsto para chegar às lojas em março de 2007.
Por Letícia Zakia
Você já declarou que “a troca da guitarra pelo baixo foi a coisa mais importante da minha vida musical”. Como aconteceu esta mudança?
Por incrível que pareça, foram os cantores Eduardo Araújo e Silvinha, da Jovem Guarda. Eles me viram tocando guitarra e eu era um péssimo guitarrista. O Eduardo sugeriu que eu deveria mudar para o contrabaixo. Então, ele me emprestou um contrabaixo e eu comecei a praticar. Depois de um mês, fui encontrá-lo e ele pediu para eu continuar praticando. Tempos mais tarde ele me colocou para tocar na sua banda. A partir daí, fui tomando gosto e aconteceu tudo muito rápido. Como eu tinha 28 anos e não era mais tão novo para começar a aprender um instrumento, eu fiz um intensivo: estudei 16 horas por dia durante um ano e foi então que eu saí tocando.
Então você não era tão bom na guitarra, mas eles conseguiram enxergar sua habilidade para o baixo?
A realidade era que eles estavam sem baixista... E me colocaram para aprender para que eu pudesse tocar com eles. Mas foi ótimo! O Eduardo e a Silvinha foram os responsáveis por esta transição do Pixinga da guitarra para o baixo.
Que estilo que você tocava na época?
Era um estilo jovem guarda, era a moda da época, um rock n’roll meio pop.
Quais as músicas, ritmos e músicos que influenciaram seu início de carreira?
Como meu pai (Bernardo Cascarelli , o XIXA do Cavaquinho) era músico, eu tive uma influência muito boa da música brasileira, mas gosto muito também de fusion e de jazz. Dos baixistas brasileiros que me influenciaram posso citar Nico Assunção, Gabriel Balis, o falecido Luizão Maia - que tocava com a Elis Regina e é tio do Artur Maia. O Brasil está cheio de gente boa e essas são algumas das influências da minha época. De fora do Brasil, tem o Jaco Pastorius, Marcus Miller, Mark King, John Patitucci, um montão de gente. E tem um baixista de quem eu sou fã, mas que não é muito conhecido na mídia, chama-se Jeff Andrews.
As suas músicas são caracterizadas pela mescla de ritmos variados, mas com personalidade própria. Há um estilo que você goste mais ou prefira tocar?
A minha formação foi baseada em Ticoria, Weather Report, Jacó Pastorius, Wayne Shorter, mais voltados ao jazz. Da música brasileira, o que eu acho legal é o chorinho, mas é um estilo muito difícil tocar, que eu nem sei tocar. Também gosto da Elis Regina, do Luizão Maia, Paulinho Braga, César Camargo Mariano, Hélio Delmiro e muitos outros. A minha música eu faço sem rotular. Antigamente eu tocava muito funk instrumental e as pessoas diziam: “O Pixinga é funk”. Para mudar essa situação e mostrar meu outro lado, eu gravei, em 1998, um disco de samba, com piano, baixo e bateria, quase acústico. Depois gravei dois discos pop, cantados. Infelizmente, no Brasil, o pessoal rotula você como se fosse uma coisa só, tocasse um estilo e pronto. Agora, por exemplo, eu acabei de gravar o meu terceiro DVD chamado “O Jogo”, com um quarteto sensacional. Eu não posso dizer que ele é baseado em apenas um estilo musical, pelo contrário, neste DVD eu juntei toda a minha bagagem de 25 anos de música instrumental.
Você já participou de eventos e festivais importantes como o Free Jazz e o lançamento de um CD em Nova York. Qual o acontecimento que você considera mais marcante nesses seus 25 anos de carreira dedicados ao contrabaixo?
Um acontecimento importante para mim foi, sem dúvida, tocar no Blue Note de Nova York, um templo do jazz. Naquele dia, eu não fui lá acompanhar ninguém, eu fui lançar o meu disco, eu levei a minha banda. Então eu me tornei o primeiro baixista brasileiro, que levou uma banda brasileira para tocar em Nova York. Há casos de turnês de Fim de Semana no Blue Note, com a presença de músicos como Ivan Lins, Gal Costa, Leo Gandman e outros brasileiros. Só que meu caso foi diferente, eu lancei um disco lá, com os meus músicos.
Como você descreveria a sensação de estar lá em Nova York lançando esse CD?
Nova York é uma cidade incrível, que proporciona tudo o que você quer. Aquela noite passou tão rápida no Blue Note, mas o astral é do lugar é incrível. Posso dizer que música respira em Nova York, então tudo fica mais fácil, muito mais ágil e você acaba se superando.
E como é ser considerado pela crítica especializada como o baixista mais rápido do mundo?
É muito bom ser reconhecido, mas eu sempre digo que eu sou um eterno aprendiz e considero que estou aprendendo ainda. Cada dia que passa eu acrescento alguma coisa nova à minha experiência.
Desde a criação do contrabaixo elétrico por Leo Fender, os graves nunca mais foram os mesmos. Como você vê o contrabaixo no cenário internacional e no Brasil nos dias de hoje?
Aqui no Brasil a divulgação da música instrumental e do contrabaixo por si só é difícil, mas quem é da área tenta incentivar, como no caso do Festival Cover Baixo. Eu fiz uma parceria com a revista Cover Baixo e estou promovendo festivais no Brasil inteiro. Depois desse aqui em Campinas, temos mais dez festivais para fazer no país, que são uma maneira de divulgar os contrabaixistas brasileiros e incentivar o público a prestigiar. Lá fora, infelizmente, ainda é o primeiro mundo em relação à gente. O mercado de música instrumental lá, por exemplo, é bem pequeno, mas é bem distribuído e divulgado. Aqui no Brasil as pessoas não têm acesso. Não temos uma rádio de música instrumental, não temos uma casa especializada em jazz e aberta para todos. Tem a casa Mistura Fina no Rio de Janeiro, mas o músico tem que pagar mais de mil reais para tocar. Então não existe oportunidade. Música instrumental no Brasil é coisa de louco!
A sua participação no 4º Cover Baixo é só como músico ou você está participando da organização?
Eu estou trabalhando na organização do Festival, junto com a Vanessa Saad da EM&T de São Paulo e do Nilton Wood, baixista e colaborador da Revista Cover Baixo.
Como você acha que eventos como o Cover Baixo podem contribuir melhorar a situação da música instrumental no Brasil?
O evento em Campinas, assim como os outros Cover Baixo que aconteceram, tem a intenção de divulgar a escola, divulgar a música brasileira e atrair o público para ver a atuação de músicos de primeira linha. As apresentações serão de grandes contrabaixistas, cada um na sua praia, cada um fazendo seu som, sem amarras.
Parece que o público brasileiro tem uma resistência à música instrumental. O que pode ser feito ela seja mais aceita pelo povo?
Na verdade, o pessoal não está acostumado com música instrumental. Veja bem, o povo brasileiro é um povo sofrido, que trabalha duro para ter um salário e sustentar sua família. Então na hora do lazer, ele prefere ir a um show e cantar. Essa vibe de música cantada, independente de estilo, de rock n’ roll a sertanejo, chega mais fácil às pessoas. Porém, se houvesse maior divulgação, uma pessoa que fosse a um show de um cantor, também iria a um show de música instrumental. Falta divulgação e espaço para shows instrumentais. A maioria das coisas que temos aqui no Brasil são os pianos-bares, onde ninguém está preocupado com a música que está sendo tocada, a qual só serve de segundo plano para o ambiente. Se tivéssemos uma casa de show, do tipo Blue Note, aqui no Brasil, as pessoas sairiam de casa com um objetivo: ver música instrumental. Aconteceu um caso interessante comigo certa vez: o dono de um bar em Bauru me chamou para fazer um show, só que ele colocou antes de mim um cara que tocou Lulu Santos. O bar estava lotado. Eu cheguei com um trio e no fim das contas nós arrasamos. Todo mundo curtiu. Então quer dizer, tudo o que é bem feito, que você passa alguma coisa, o público aceita.
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